Cave Story foi um dos jogos indie mais conhecidos, feito unicamente por Daisuke Amaya, também conhecido como “Pixel”, também responsável pelo jogo indie Ikachan, antes de Cave Story. O que começou como um projeto “freeware” (gratuito para jogar), foi logo acolhido e se tornou um produto oficial, que fez muito sucesso, destacando o jogo e o criador, Pixel, e trazendo uma legião de fãs.
Anos depois de Cave Story, o criador anunciou em 2014 uma demo de um projeto que estava sendo criado chamado Gero Blaster, com a demo intitulada de Pink Hour. Não muito depois da demo ser lançada, o jogo oficial foi lançado para PC e dispositivos móveis, sob o novo nome de Kero Blaster, o mais recente trabalho de Pixel e seu pequeno estúdio.
O jogo ficou um pouco obscurecido pelo limite de plataformas em que havia sido lançado, mas em 2017 ganhou um port para PS4 e, em agosto de 2018, um port para Nintendo Switch, ganhando novos modos e maior visibilidade, e em comemoração do lançamento para o Switch, hoje vamos dar uma olhada nesta versão de Kero Blaster e ver quais aventuras pixelizadas o estúdio tem para nos contar.
Antes de mais nada, a tela de título de Kero Blaster é algo que merece uma atenção especial. Ao iniciar o jogo, tudo o que você vê é uma sala de escritório lotada de monstrinhos pretos de olhos vermelhos, um sapo com uma arma, e um telefone vermelho. Após se mexer, o jogador se dá conta que está controlando o sapo e que precisa destruir as criaturas de olhos vermelhos. Algumas estão suspensas no ar, o que requer que se mire para cima. Outras estão atrás de plataformas e precisam que o jogador pule para chegar nelas. Uma delas está tão acima do jogador que requer que este pule E mire para cima, e enquanto ela cai, ela mostra que pode machucar o jogador enquanto cai, mas que o jogo tem uma barra de vida, então você não perde uma vida automaticamente.
E depois de limpar a tela das criaturas, o título do jogo se ilumina e o telefone começa a tocar, iniciando Kero Blaster. Sem nenhuma palavra, o jogo acaba de ensinar todas as mecânicas básicas que qualquer um precisa saber.
O jogo conta a história de um sapo que trabalha como zelador na empresa “Cat & Frog Inc.”, mostrando a rotina de trabalho onde o sapo recebe ordens (que ele não entende) de uma gata presidente da empresa, contando apenas com a ajuda dos seus companheiros de trabalho para saber o que fazer.
Os dois companheiros, um gato preto e uma criaturinha rosa que parece um “slime” de jogos como Dragon Quest, conversam com o sapo e guiam ele para a próxima área marcada que ele precisa limpar das estranhas criaturas pretas de olhos vermelhos.
O protagonista é mudo, contando apenas com os personagens e o cenário ao seu redor para continuar a narrativa. E após pegar sua arma e subir no teletransportador, o sapo começa sua jornada de trabalho.
E assim o jogo começa com sua primeira fase. O jogo se trata de um jogo de plataforma e “run n’ gun”, no estilo de jogos como Contra ou Mega Man, contando com sistema de vidas e corações representando dano, onde o jogador passa de fase para fase pulando e correndo de obstáculos e atirando em tudo que se mexa, com um chefe aguardando o jogador ao final de cada fase.
O visual do jogo é bastante parecido com jogos de 8-bits, tanto graficamente como musicalmente, com personagens e cenários com detalhes bem trabalhados e perigosamente fofos, bem no estilo tradicional do Studio Pixel.
Em quase todo o jogo, o visual apenas contribui ao charme retrô da experiência, atrapalhando apenas em alguns casos com inimigos completamente pretos que por não possuírem nenhum destaque ao seu redor, podem acabar se mesclando com o plano de fundo, fazendo com que fiquem mais difíceis de ver.
O jogador começa com apenas uma arma simples que atira repetidamente a uma curta distância, mas enquanto passa pelas fases, pode conseguir moedas cujo os inimigos deixam ao serem derrotados ou podem ser achadas em baús escondidos, além de armas novas após derrotar os chefes. As moedas adquiridas podem ser gastas em uma das lojas encontradas em cada uma das fases, seja em melhorias para as armas, novos corações para conseguir levar mais dano antes de cair ou vidas extras.
Kero Blaster é um jogo que, assim como os jogos em que é inspirado, tem uma dificuldade bem alta e conta com reflexos rápidos e bastante paciência. O jogo constantemente joga inimigos fortes ou em lugares estratégicos e situações de plataforma que precisam de pulos e movimentos bem calculados. O jogador pode atirar em 3 direções, e enquanto o botão estiver segurado, pode se mexer para os lados e pular enquanto atira na direção escolhida, exigindo que o jogador solte o botão para mirar em outra direção. Além disso, o movimento do protagonista é levemente escorregadio e pesado, demorando um pouco para começar a correr e parar de correr, além de pulos lentos e com uma distância bem definida.
Imagine jogar Contra com os controles e a física do movimento de Super Mario Bros. Apesar de ambos serem jogos de plataforma, a física e as mecânicas de ambos são completamente diferentes, algo que veteranos de jogos do tipo com certeza vão notar.
O controle escorregadio acaba por dificultar o manejo do personagem, demandando um certo período de adaptação do jogador, o que pode acabar deixando certas situações um tanto frustrantes já que as vidas são contadas e ao perder todas, o jogador é levado de volta para o começo da fase, e não ao “checkpoint” mais recente. Porém, é algo adaptável com um pouco de prática, e põe mais ênfase em uma aproximação mais lenta e cuidadosa, que pode levar a uma sensação maior de triunfo ao terminar uma fase.
Os chefes do jogo são enormes, enfrentados em uma área confinada e geralmente possuem mais de uma fase ou forma e inimigos menores povoando o cenário, dando um pouco da sensação de um “bullet hell” com tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo na tela.
Como mencionado anteriormente, ao derrotar um chefe, o jogador obtém uma arma especial que possui propriedades únicas: uma que se espalha e cobre uma área maior, uma rajada de bolhas que flutuam na água e descem ladeiras em terra firme, um lança-chamas que cuida facilmente de obstáculos de gelo e até uma mochila a jato que ajuda em situações complicadas de plataforma.
Kero Blaster também conta com uma história um tanto alegórica, algo que não é estranho ao criador. Durante o desenvolver da história, é mencionado que os monstros pretos são chamados “Negativus Legatia” (nome que já dá uma ideia do que elas se tratam), e que a presença deles pode estar ligada à presidente da empresa, que possui um dos monstrinhos em um aquário como uma espécie de bicho de estimação, e com o passar das fases, ele fica cada vez maior e a presidente, mais… afetada.
As “Negativus Legatia” parecem se multiplicar, sendo vistas em várias fases como inimigos, entupindo os teletransportadores que o sapo usa, afetando outros habitantes do mundo onde a história se passa e até se manifestando em chefes. É teorizado que elas signifiquem, como o próprio nome implica, memórias ou passado negativo, mas como surgem, qual o motivo delas, e qual exatamente é o efeito delas nos seres que ali habitam, é apenas levemente discutido através de cenas e ambientes do jogo.
Ao terminar seus trabalhos, o protagonista se vê transportado para um lugar diferente por culpa dos monstros, o que o força a tomar outro caminho mais longo para voltar para a empresa. Ao mesmo tempo, os trabalhadores decidem que o bicho de estimação da presidente pode ser um perigo, e coisas na empresa começam a piorar. O que acontece quando o protagonista finalmente volta, só será visto no final…
O jogo consiste de apenas 7 fases, cada uma relativamente longa e capaz de levar um bom tempo, especialmente se considerar as várias mortes e “game overs” que o jogador provavelmente sofrerá. Felizmente, o jogador pode continuar quantas vezes quiser e as moedas obtidas continuam mesmo após perder todas as vidas, o que pode facilitar a compra de alguns equipamentos e melhorias (que são consideravelmente caras), facilitando a jornada.
Dito isto, após terminada a campanha normalmente, o jogo apresenta a opção do novo modo “Zangyou” (“Horas Extras”), que deixa o sapo azul, continua a história e repagina todas as fases, deixando a experiência ainda mais difícil, que com certeza consumirá uma boa quantidade de tempo do jogador.
O modo Zangyou é, sem dúvida, o modo mais difícil do jogo, seguindo mesmo a tradição que os veteranos de Cave Story vão reconhecer como característica do criador, com fases bem mais longas e complicadas do que anteriormente — especialmente nas finais — além de alguns chefes completamente novos.
Neste modo é onde os problemas com os controles previamente mencionados chegam a ficar especialmente frustrantes, já que são necessários vários movimentos precisos que são difíceis de conseguir com os controles escorregadios. Você terá determinação o suficiente para ver o verdadeiro final?
E se isso ainda não for suficiente, ao final do modo Zangyou o jogador é questionado se está satisfeito com o jogo, e se responder que não, é aberto o modo final, chamado “Omake” (“Extra” ou “Bônus”), que deixa nosso protagonista amarelo.
Enquanto o modo Zangyou era uma espécie de modo difícil, o modo Omake é mais parecido com um “New Game+”, onde todos os upgrades de armas do modo Zangyou são mantidas, mas todo o dinheiro é retirado e se começa apenas com um coração, ou seja, um golpe só e o jogador perde uma vida.
Felizmente, os novos contêineres de corações são relativamente baratos, então este último modo é algo que possibilita que os jogadores peguem todos os upgrades que não conseguiram antes e oferece um desafio mais leve, além de uma arma secreta apenas obtida através de atalhos que não eram alcançáveis antes no decorrer das fases e um modo Boss Rush ao final da jornada.
Em conclusão, Kero Blaster é um passo seguro para o Studio Pixel, sendo algo mais simples e menos ambicioso que Cave Story, e que enquanto é um pouco frustrante por conta dos controles e algumas vezes que inimigos são colocados em lugares injustos, ainda é um jogo simples e divertido que serve perfeitamente ao aspecto portátil do Switch e fornece uma experiência cativante e com várias coisas a se pensar e discutir.
O jogo está disponível para Nintendo Switch, PlayStation 4, PC e dispositivos móveis, por um preço em torno de R$30.00, dependendo da plataforma de sua escolha. Uma jogatina de início ao fim de um dos três modos dura em torno de uma hora e meia, dependendo da habilidade. É recomendável que seja jogado em sessões mais curtas para aproveitamento melhor e menos frustração, mas Kero Blaster continua sendo uma aventura cativante e divertida, lembrando o que amamos (e odiamos) tanto dos jogos de plataforma em 8 bits.
Confira o trailer:
Artigo escrito por: Ítalo Magno