Quando se discute Castlevania, costuma-se dividir a franquia entre o estilo de jogo clássico, onde o foco é a progressão linear por fases, e o “metroidvania”, de cenário mais expansivo e focado em exploração. Quando os estilos são mencionados, os títulos mais comuns a serem lembrados são Symphony of the Night, para os metroidvania, e Super Castlevania IV, para os clássicos, e por bons motivos: Symphony of the Night foi o primeiro a colocar o universo da franquia em um plano de exploração, e Super Castlevania IV reinventou – e, para alguns, aperfeiçoou – o controle e visual dos jogos clássicos. Porém, entre os dois jogos, tivemos pequeno diamante não-lapidado que foi esquecido pelos jogadores e, segundo rumores, pela própria Konami, chamado Castlevania Bloodlines.
Lançado em 1994, Castlevania Bloodlines, conhecido como バンパイアキラー ou Banpaia Kira (“Vampire Killer”) no Japão, e Castlevania: The New Generation na Europa, foi lançado exclusivamente para o Mega Drive (ou Genesis, nos EUA) para dar ao console um gosto da caça aos vampiros. O jogo se passa em 1917, uma era mais moderna em comparação aos jogos da saga até agora, contando que, após a derrota de Drácula pelas mãos de Quincy Morris (o mesmo da história de Drácula de Bram Stoker), que era parente distante da família Belmont – a que deu fim várias vezes a Drácula, o começo da Primeira Guerra Mundial levou a Europa de volta às trevas, e por trás disso está a condessa Elizabeth Bartley (muito provavelmente inspirada em Isabel/Elisabete Bathory), sobrinha de Drácula, que planeja a ressurreição de seu tio, e para isso haveria favorecido o início da Primeira Guerra para poder utilizar das almas que morreriam com a guerra. Dado isto, John Morris, o filho de Quincy, brandindo o chicote abençoado Vampire Killer (o mesmo que Simon Belmont usava) juntamente ao seu amigo Eric Lecarde, brandindo a lança Alcarde (provável má tradução de “Alucard”), saem em uma jornada por toda a Europa para dar um fim aos planos de Elisabeth Bartley. Como muitos jogos da época, a maior parte da história está presente apenas no manual, mas o jogo mostra uma introdução com a premissa de forma resumida, apresentada abaixo.
https://www.youtube.com/watch?v=b_RP6m733hs
O visual é bem detalhado e no tom arrepiante já característico de Castlevania, assim como Super Castlevania IV. O jogador dessa vez passará por diversos locais da Europa, como o castelo de Drácula na Transilvânia, a Torre de Pisa na Itália e até mesmo uma fábrica de armamentos na Alemanha. Porém, Bloodlines se destaca dos jogos anteriores por não esconder vários detalhes sangrentos. Dadas as diretrizes menos restritivas do console, Bloodlines dá um tom bem mais gráfico à saga que já era sombria e tenebrosa, mostrando abertamente sangue, decapitações, mutilações e mais uma boa quantia de violência gráfica animada (que não chega a ser realista, ou algo tão perturbador quanto). O console tinha mesmo uma fama de ser a “alternativa radical” dos consoles da época, então faz sentido que o jogo tenha menos rodeios com relação a isso, e casa muito bem com o visual mais “gótico” da saga. Infelizmente, a versão europeia foi censurada de alguns desses detalhes.
Musicalmente, a composição combina perfeitamente com o jogo, achando um encontro maravilhoso entre atmosférico e energético, sendo o primeiro Castlevania a receber o maravilhoso trabalho de Michiru Yamane (que viria a compor a trilha sonora de vários outros títulos da saga, como Symphony of the Night e Aria of Sorrow). Escute a música da primeira fase:
Todos os elementos dos Castlevanias de plataforma estão presentes: Dificuldade alta, criaturas horripilantes de diversas origens, itens obtidos em velas espalhadas pelas fases, itens escondidos em paredes e grandes fases com chefes aguardando ao fim de cada uma delas – e em quase todas as fases, também existem subchefes na metade destas. Com relação a sua jogabilidade, Bloodlines mantém o controle tradicional de um jogo da saga: controles levemente rígidos, onde o jogador precisa calcular bem seus pulos já que não pode mudar a direção deles no ar, golpes com uma leve latência que demandam um “timing” correto, ser empurrado para trás após levar um golpe inimigo e a habilidade de usar armas secundárias, que desta vez estão em velas diferentes das que itens comuns aparecem, deixando mais fácil manter a arma secundária de sua preferência. Bloodlines possui algumas características próprias: a habilidade de escolher entre dois personagens no começo da jornada é um delas, com cada personagem tendo habilidades diferentes.
John Morris possui a habilidade de manusear o chicote em direções bem específicas: diretamente à sua frente, diretamente abaixo de si e diagonalmente para cima – e essas duas últimas só podem ser realizadas durante um pulo. Uma decisão um pouco estranha, mas útil de qualquer forma. Além disso, o chicote pode ser usado para se pendurar em qualquer telhado ou plataforma para se balançar e atacar quem estiver em sua frente, desde que o jogador mire bem uma chicotada em diagonal.
Já Eric Lecarde possui uma habilidade um pouco maior com sua lança: A lança pode ser mirada em oito direções, além de ser um pouco mais rápida e pode ser girada de um lado para o outro, cobrindo certos ataques de projétil. Eric também pode se apoiar em sua lança para realizar um pulo mais alto, basta segurar o direcional para baixo por alguns segundos e apertar o botão de pulo.
Ambos os personagens possuem melhorias para suas armas que fazem com que o alcance e força destas aumente, além de conferir uma arma secundária especial. Ao obter o máximo de melhorias para sua arma, o próximo “upgrade” vai fazer com que a música da fase mude temporariamente (até o jogador levar um golpe) para uma música clássica da saga, como “Vampire Killer” e “Bloody Tears”! É um bônus difícil de conseguir, mas bem recompensador.
As armas secundárias, além de serem mapeadas a um botão diferente no controle (assim como em Super Castlevania IV), possuem dois modos de uso: ao apertar o botão, será lançada a versão normal daquela arma secundária, e ao apertar cima + o botão, uma versão melhorada daquela arma será lançada, custando alguns diamantes (o equivalente aos corações de Castlevanias anteriores – a munição, basicamente) a mais. Além disso, uma notícia boa aos veteranos da saga é que ambos os personagens conseguem pular diretamente em cima de escadas e pular para fora das escadas, esta última habilidade estranhamente ausente de outros jogos da saga (exceto Rondo of Blood).
O jogo possui 6 fases, contando com um “boss rush” no final, e algo novo para a saga: “Continues” limitados. Se o jogador perder todas as vidas restantes, terá de usar um dos 2 continues restantes, e ao perder todos eles, terá de retornar à primeira fase. O VERDADEIRO TERROR!!! O jogo possui um sistema de senha (“password”), mas as senhas mantém o número de vidas e continues que o jogador tinha no momento que recebeu a senha, o que pode ser um problema especial se só restar uma vida…
Ao final da jornada, após enfrentar criaturas como a própria Morte (pela milésima encarnação, aparentemente… se bem que quem viria para matar a morte?) John e Eric encontrarão Elizabeth Bartley, que, apesar dos esforços de nossos protagonistas, consegue ressuscitar Drácula, e cabe aos destemidos protagonistas impedir que ele volte a aterrorizar o mundo novamente. Se conseguir, você será levado à tela que mostra o final…
…se você tiver jogado no modo Expert.
Sim, Bloodlines é um daqueles jogos que bloqueia o final verdadeiro através da dificuldade mais alta. Era uma prática muito comum em jogos da época, outro exemplo sendo Contra 3: The Alien Wars, da própria Konami. Apesar de ser um pouco chato não receber o final verdadeiro, o jogo é perfeitamente planejado para mais de uma jogatina de início a fim, e com apenas 6 fases, é perfeitamente possível, apesar de difícil. Uma sugestão é jogar a primeira vez com um personagem e a segunda vez com o outro. Se você consegue terminar ou não, está apenas em suas mãos!
Castlevania: Bloodlines é um jogo que não recebeu um relançamento em nenhuma plataforma além do cartucho de Mega Drive, o que levou o jogo a ser obscurecido ao longo do tempo, o que é uma GRANDE pena, porque o jogo é um excelente título da saga! A jogabilidade é sólida, a música e atmosfera são deliciosamente arrepiantes e energéticas, é um teste de habilidades de quem joga e o jogo encoraja várias jogatinas, dando um sentimento bem “arcade” à experiência no geral. Então fica aqui o desafio e a recomendação – Bloodlines merece sua atenção, e se você é um fã de Castlevania, não perca tempo para experimentar o game. Arme o chicote, prepare a lança e afie as habilidades e impeça o grande vampiro de voltar e dominar a Transilvânia novamente!
Veja também o Densetsu Indica sobre Super Castlevania IV aqui.
Artigo escrito por: Ítalo Magno