Confesso que quando me deparei com World’s End Club, tive minhas dúvidas sobre desbravar esse título para um review, afinal, um dos nomes envolvidos no desenvolvimento é o de Kazutaka Kodaka, criador da franquia Danganronpa. Embora eu tenha apreciado a história de Trigger Happy Havoc, o primeiro jogo da popular série de Kodaka, a segunda metade da experiência me deixou muito desapontado.
Infelizmente, algo parecido acontece nesta nova obra de temática semelhante. Vamos por partes…
[Atenção: esta análise contém spoilers não marcados do início do jogo!]
Outro jogo mortal com estudantes e mascotes
World’s End Club começa de uma maneira bem peculiar, colocando jogadores logo de início no controle de um grupo de crianças enfrentando o que parece ser uma aberração tecnológica. Entretanto, após os primeiros minutos, a trama toma um rumo bem remanescente de Danganronpa.
Com uma introdução que mistura cenas da vida real com CGI, somos apresentados a uma turminha assistindo a um filme de terror em um ônibus durante um passeio da escola. A história entra em movimento com um estranho meteorito que cai do céu e engole tudo em um clarão.
Despertando em um parque de diversões submerso, os jovens se veem obrigados por um mascote robótico chamado Pielope a participar de um jogo mortal. Nesse “Jogo do Destino”, o objetivo sinistro é que as crianças realmente se matem, com muitos mistérios e dúvidas surgindo logo de início.
Apesar da situação tensa, os estudantes conseguem sair ilesos do perigo e escapar para a superfície. Nesse ponto, o jogo abandona toda a sua aparente premissa e dá início ao jogo real: uma aventura pelo fim do mundo através dos olhos de um grupo de crianças.
O clubinho do fim do mundo
A partir desse ponto de virada, o jogador não precisa se preocupar tanto em ter que navegar pelo cenário, já que muitas vezes seu controle do grupo é retirado por cutscenes que avançam a aventura. Cada local visitado dá início a novos diálogos e também é possível interagir com cada personagem nos acampamentos que organizam todas as noites. Nesses momentos, podemos conhecer um pouco mais das crianças e saber como esses acontecimentos estão lhes afetando pessoalmente.
Cada figura do grupo é única e interessante e todos sofrem uma evolução em sua personalidade, crescendo como pessoas e deixando para trás medos e preocupações que os atormentam. Isso faz sentido especialmente quando lembramos que todos ali têm por volta de apenas 12 anos de idade.
Apesar de apresentar uma narrativa convincente repleta de mistérios e reviravoltas capazes de prender a atenção do jogador, World’s End Club eventualmente começa a perder o equilíbrio. Infelizmente, próxima ao seu clímax, a trama mergulha em direção a catástrofe, derramando muitas informações que acabam forçando demais a barra.
Algumas das revelações não são tão chocantes quanto parecem, já que um jogador atento pode facilmente desvendá-las antes da hora. Além disso, a história parece derivar muitos de seus elementos de outras obras semelhantes, como alguns momentos icônicos de séries como Neon Genesis Evangelion.
Aventuras de criança
A jogabilidade de World’s End Club é, essencialmente, dividida em duas modalidades. A primeira e mais proeminente são as cenas de história e diálogos apresentados de forma semelhante a uma visual novel.
Esse modo de jogo é direto ao ponto, mas algumas funcionalidades úteis presentes em outros jogos que utilizam esse sistema teriam sido bem-vindas. Mais especificamente, me refiro à opção de avançar rapidamente por textos já lidos e de acessar um registro com tudo o que foi dito na cena; dois elementos ausentes no jogo.
Por outro lado, as partes de “visual novel” apresentam várias escolhas para o jogador que podem influenciar o decorrer da aventura. Isso é bom, pois encoraja novas jogatinas por essas cenas para descobrir todos os detalhes da história que foram escondidos por decisões alternativas.
Em adição, temos os “momentos de ação”, onde navegamos por cenários horizontais através de plataformas. No controle de um ou mais personagens, o objetivo dessas sessões é chegar até um local específico e resolver pequenos puzzles pelo caminho. Os controles nessas partes são bem simples e responsivos, mas é preciso ter bastante cuidado, já que ataques de inimigos podem causar morte instantânea com apenas um golpe.
Além de poder pular e interagir com certos objetos, também é possível utilizar poderes especiais que as crianças vão despertando ao longo da aventura. Cada personagem tem acesso a uma habilidade especial, que é utilizada para completar os desafios. Infelizmente, os puzzles em si são bem simples e as habilidades, mesmo que interessantes, acabam não sendo tão aproveitadas.
A maioria dos puzzles envolvem empurrar certos objetos ou pressionar algum botão. Eles não são difíceis e parecem servir mais para encher linguiça, esticando o tempo de jogo. Temos também certos momentos de confrontos contra inimigos e chefes que funcionam apenas para fazer com que o jogador aprenda a utilizar uma nova habilidade desbloqueada.
Infelizmente, o jogo sofre com alguns glitches que, mesmo não sendo tão recorrentes, acabam estragando um pouco da experiência. É comum voltar de um game over e seu personagem simplesmente ficar congelado, ou um dos parceiros travar em uma pose única. Mortes durante batalhas contra chefes também são terríveis, já que em alguns casos o jogo faz com que o jogador tenha que reiniciar os confrontos desde o inicio, sem permitir pular as cenas cinemáticas.
Apresentação cheia de altos e baixos
World’s End Club tem um visual bastante chamativo, apresentando personagens com visuais bem peculiares. O estilo de arte em si é algo que chama bastante a atenção ao iniciar a aventura, e os desenvolvedores apostam pesado na apresentação para surpreender os jogadores.
Ao longo do jogo, somos apresentados a personagens com modelos 3D simplificados, imagens estéticas desenhadas à mão e cutscenes animadas. Essa mistura doida de estilo não oferece nenhum problema e, pelo contrário, faz o título se diferenciar bastante em relação a obras semelhantes.
Os cenários também são muito bonitos e bem variados, oferecendo desde cidades abandonadas a lugares como cavernas. Cada lugar, mesmo que seja visto apenas do plano 2D, oferece pequenos detalhes que podem ser observados e apreciados pelos mais atentos.
O mesmo pode ser dito da música e dos efeitos sonoros, que contribuem muito para melhorar a experiência. Em especial, canções que tocam durantes batalhas contra chefes fazem um ótimo trabalho para incentivar o jogador a dar o seu melhor. Além disso, uma das crianças possui o pode de se transformar e, sempre que isso é ativado, presenciamos uma incrível sequência digna de tokusatsu, no melhor estilo Kamen Rider.
Quanto à dublagem, ambas as opções em inglês e japonês — que o jogador pode escolher nas opções — fazem um ótimo trabalho. No geral, as vozes não soam nada monótonas, o que melhor ainda mais os personagens. Contudo, apesar da localização ser aceitável, como é de praxe em um jogo publicado pela NIS America, existem algumas coisas melhor explicadas em um tópico separado…
Memes e mistérios
Jogadores familiarizados com as obras distribuídas pela NISA já sabem que seu trabalho de localização tende a apresentar alguns elementos controversos no texto. Exemplo comuns incluem frases completamente alteradas, personagens fugindo de sua caracterização original e até mesmo a inclusão de memes.
Apesar de não ser excessivo, World’s End Club contém alguns desses problemas, trazendo diálogos repletos de referências a piadas antigas sem qualquer contexto.
Por exemplo, uma discussão a respeito de comida que resulta em um momento extremamente trágico tem seu tom levemente alterado com uma referência a abacaxi em pizza. Noutro momento, o diálogo entre os personagens parece referenciar o popular jogo Among Us. Coincidentemente, um dos capítulos da trama leva o título “Fungus Among Us?”, o que pode ser só uma rima inocente, mas, em meio a tantas piadas, quem sabe?
Obviamente, é possível ignorar as piadinhas e memes inseridos. No meu caso, isso serviu para me desconectar um pouco da trama, já que algo que poderia ser um pouco mais sério acaba perdendo o impacto quando os próprios personagens resolvem fazer piadas ruins.
O clube que ficou unido mesmo no fim do mundo
A premissa de World’s End Club é interessantes, graças a personagens curiosos e um mistério inicialmente intrigante. Entretanto, problemas de pacing acabam prejudicando a trama, dando a impressão de que a história acabou não conseguindo se encaixar bem com o tempo do jogo e seu texto.
Tentando focar em uma história mergulhada em suspense, o game sacrifica muito sua jogabilidade outrora interessante. Puzzles extremamente fáceis e sem desafio e entediantes batalhas contra chefes aguardam para decepcionar os desavisados. A ideia de um grupo de crianças que devem se ajudar podia ter sido usada de uma maneira bem melhor.
World’s End Club possui uma história que começa de forma engajadora, mas acaba perdendo o momentum antes do final. Além disso, sua jogabilidade simples e puzzles não oferecem nenhum desafio, o que desaponta bastante. Ademais, glitches e erros, obviamente, não ajudam em nada.
Por outro lado, o estilo artístico da obra é muito bacana e sua apresentação no geral chama a atenção. Para aqueles que desejam algo diferente, os visuais e efeitos sonoros certamente serão uma surpresa agradável.