Final Fantasy XIV, mais de 2000 horas depois | Uma jornada pessoal

Como um dos maiores MMORPGs da atualidade pode transformar vidas: uma experiência pessoal e envolvente.


Você já ouviu falar do MMORPG aclamado pela crítica, Final Fantasy XIV? Ele oferece um período de testes gratuito que inclui toda a seção inicial A Realm Reborn, a expansão premiada Heavensward e a emocionante expansão Stormblood até o nível 70, sem restrições de tempo de jogo. Pois é… em 2020 eu ouvi falar ele.

Final Fantasy XIV é um game produzido pela Square Enix. Apesar de um início conturbado em 2010, o jogo literalmente renasceu das cinzas graças a uma equipe dedicada a resolver todos os seus problemas. Com inúmeros prêmios conquistados e se tornando o produto mais rentável na história da desenvolvedora, é seguro dizer que o plano funcionou.

Adotando um estilo de jogo que fica entre a clássica batalha por turnos e o combate repleto de ação das obras mais modernas da franquia, Final Fantasy XIV é ao mesmo tempo uma homenagem e uma inovação em relação aos títulos tradicionais da série. Esse é um dos principais fatores que tornam o jogo tão especial.

Como em todo MMORPG, atividades como raids, uma mescla de conteúdo PvP e PvE, produção de itens e armas brilhantes extremamente difíceis de conseguir estão presentes. No entanto, alguns detalhes mais sutis diferenciam o game da concorrência.

O que torna FFXIV diferente

Dentre esses detalhes, sem dúvida o que me chamou atenção logo de cara foi a comunidade. Talvez seja de conhecimento comum, mas quase todos os anos, durante eventos como The Game Awards, vemos Final Fantasy XIV no mínimo sendo nomeado para a categoria de melhor comunidade online. Nos últimos anos, não é estranho vê-lo vencendo.

Um contexto divertido para comparação é que, antes de adentrar Eorzea, o mundo do jogo, eu costumava jogar League of Legends e Overwatch — jogos conhecidos pelo excesso de… palavras carinhosas ditas durante as partidas. Se você já assistiu o seriado The Good Place, foi mais ou menos daquele jeito que me senti nos primeiros dias em FFXIV.

É impressionante como as pessoas são educadas e acolhedoras no jogo. Assim que comecei a ter contato com as primeiras dungeons, imediatamente reparei que meu grupo encheu o chat com “o/” e outras saudações amigáveis. Achei estranho, mas respondi de acordo; eu era apenas um white mage nervoso por curar pela primeira vez.

Ao longo dessa primeira dungeon e das que se seguiram, fui notando um padrão: todos se cumprimentavam amistosamente ao se encontrarem e, quando alguém cometia um erro, as mensagens costumavam ser encorajadoras, com dicas ditas da maneira mais gentil possível.

Foi durante a terceira dungeon do jogo que o jogador tanque do meu grupo disse algo como: “Ei, Elizabeth, você pode curar menos e atacar mais os monstros? Eu consigo ficar vivo por um tempo”. Assim, sem envolver os coitados dos meus pais na sugestão, era algo jamais visto em um jogo online. Agradeci a sugestão e, de fato, nosso rendimento melhorou muito. 90% do meu nervosismo como curandeiro acabou nesse dia, então obrigado, guerreiro aleatório!

Seguindo para outro detalhe que me surpreendeu, dessa vez algo que já deve ser mais difundido dado o tempo que o jogo existe: a história. Eu joguei Ragnarok Online em seus anos dourados, na época em que as telas de computadores de lan house quase sempre tinham esse jogo ou uma partida de Counter-Strike 1.6 rolando. Jogos online com histórias típicas de RPG não eram novidade para mim.

Contudo, Final Fantasy XIV é diferente. Primeiramente, vale deixar registrado que isso é uma característica específica da equipe que assumiu o game para “salvá-lo”, como citei no início. Dessa forma, o começo do jogo, intitulado A Realm Reborn, é sem dúvida meio sem sal, como a maioria dos MMORPGs são nesse aspecto. Já quando começam os segmentos finais dessas primeira etapa, a coisa fica muito mais distinta.

Sempre fui muito apaixonado por jogos com narrativas interessantes. Meu primeiro contato com jogos foi com títulos como Dragon Quest, Fire Emblem, Valkyrie Profile e o próprio Final Fantasy, especificamente o IV. Assim, uma boa história não era algo que me surpreenderia facilmente, mas FFXIV foi muito além de qualquer coisa que eu havia experimentado antes.

No momento da produção deste texto, estamos aguardando o lançamento da quinta expansão do game, Dawntrail. Desde então, fui fisgado pela história no fim do jogo base, joguei a primeira expansão, Heavensward, como se fosse o melhor livro de fantasia da minha vida, derramando lágrimas em diversos momentos da trama e repetindo o processo nas demais expansões.

A capacidade que Final Fantasy XIV tem de criar personagens cativantes é algo raro no mundo dos games e ainda mais raro no mundo dos MMORPGs. É incrivelmente difícil criar um mundo imersivo com uma história bem escrita enquanto outros jogadores passam por você constantemente. Como sofrer após a morte de um personagem querido quando, no caminho até a quest, você viu duas garotas com orelhas de gato seminuas e um personagem musculoso de 2 metros de altura com uma máscara de sapo? De alguma forma, FFXIV consegue.

Atrelado à qualidade da história, está a própria comunidade, mais uma vez sendo um dos fatores mais positivos do game. É virtualmente impossível obter spoilers sobre a história de qualquer uma das expansões, a não ser que o próprio jogador procure ativamente por eles. Jogadores aleatórios evitam falar sobre acontecimentos mínimos da história, respeitando a experiência de novos jogadores.

Essa cultura de não-spoiler é um choque, especialmente quando saio de FFXIV para jogar alguma outra coisa (estou olhando para você, Honkai: Star Rail). Quanto mais jogos online com história você joga, mais incrível a comunidade de Final Fantasy XIV se torna, e comparações são inevitáveis.

Mas e o jogo?

Nenhum desses detalhes maravilhosos teriam seu devido valor se Final Fantasy XIV não fosse um excelente jogo. Felizmente para a Square Enix (e para mim), o gameplay é extremamente satisfatório. Não importa qual classe o jogador escolha para começar, se jogará sozinho ou com amigos, ou mesmo se a versão escolhida for a gratuita ou a paga.

O ciclo natural de jogabilidade, especialmente para iniciantes, é o seguinte: escolhe-se uma classe de combate (no meu caso, white mage). O jogador então terá duas opções de quests para avançar: uma com a trama específica de sua classe escolhida, e outra chamada popularmente de “MSQ” ou “Main Story Quest”, que é o enredo principal do jogo.

Ao avançar nas quests de sua classe, o jogador adquire mais conhecimento sobre as origens e situações que envolvem a história da profissão, desbloqueia novas habilidades e recebe equipamentos. Já ao progredir nas quests da história principal, como era de se esperar, a narrativa de Final Fantasy XIV se desenvolve.

Mantendo a cultura de zero spoilers preservada, o personagem do jogador é um viajante que acaba de chegar em Eorzea, em uma das três cidades-estado principais: Ul’Dah, Gridania ou Limsa Lominsa. A escolha da cidade é definida pela classe inicial do jogador, cuja guilda responsável se localiza em uma dessas três opções. Conforme a trama inicial se desenrola, fica claro que algum tipo de entidade divina se comunica com seu personagem, o que chama a atenção de pessoas importantes.

Desenvolver suas habilidades dentro de sua classe e descobrir mais sobre os talentos concedidos pela entidade misteriosa levará o jogador a se envolver cada vez mais nas intrigas políticas e sociais de Eorzea, apresentando aquele novo mundo e ensinando como ele funciona.

Após concluir as primeiras quests, o game ensinará ao jogador, por meio de um tutorial prático, as obrigações da função escolhida em um time com outras pessoas. Dessa forma, caso tenha começado com uma classe tanque, o tutorial focará em como atrair a atenção dos inimigos para proteger seus aliados. No caso de classes ofensivas, será ensinado como eliminar inimigos da maneira mais eficaz possível, enquanto curandeiros focarão em manter o tanque do time vivo.

Essa preparação deixa claro aos novos jogadores que, durante os conteúdos de combate, o time funciona como uma engrenagem, onde cada um tem seu papel definido. Conforme o jogo avança, esses papéis são expandidos de diversas formas, e cada classe tem suas particularidades dentro de sua função no time. Alguns curandeiros focam em gerar escudos, enquanto outros curam de maneira direta; existem tanques que roubam vida e outros que usam habilidades para reduzir o dano recebido, entre outras variações.

Assim, o jogador está pronto para sua primeira dungeon, que, caso todos tenham compreendido seu papel, seguirá da seguinte maneira: o jogador tanque partirá na frente dos demais, atraindo a atenção dos inimigos para si; os jogadores ofensivos atacarão os inimigos com tudo o que têm, enquanto o curandeiro manterá a vida do tanque em níveis seguros, atacando e curando outros companheiros conforme a situação exigir. Para jogadores novos, essa organização logo de cara é muito satisfatória.

As dungeons, que são os conteúdos mais comuns do game, são sempre feitas com um time composto por um tanque, dois causadores de dano e um curandeiro. Conforme novos conteúdos são desbloqueados, o jogador terá acesso aos trials, que são batalhas de chefe onde o time pode ter até 8 jogadores (dobrando a formação de dungeons, e às raids, que são basicamente dungeons gigantes com grupos ainda maiores de até 24 jogadores.

A grande maioria dos conteúdos de combate é desbloqueada ao avançar na história, garantindo o gameplay central do jogo: quests de classe > quests de história > conteúdo de combate. Fora desse loop tradicional, existem sidequests, FATEs (eventos aleatórios de combate no mundo onde qualquer jogador nas redondezas pode participar) e minigames inspirados em jogos da vida real e de outros games da série Final Fantasy, como o Triple Triad de FFVIII.

Recentemente, a equipe de desenvolvimento do jogo introduziu dois sistemas que permitem ao jogador realizar os conteúdos de combate relacionados à história de maneira totalmente solo, acompanhado de NPCs. O sistema Trust, que simula que o jogador tem sua própria “party”, composta pelos seus aliados na história, enquanto o sistema Duty Support funciona de maneira similar, mas com personagens fixos de cada dungeon. Conteúdos mais estratégicos, como trials e raids, permanecem apenas multiplayer.

Por fim, os jogadores também podem adquirir classes de coleta e manufatura, como alquimistas, mineradores e cozinheiros. Essas classes não possuem aptidão para combate e são usadas especificamente para produzir itens e coletar matéria-prima. Isso movimenta a economia do jogo por meio de um sistema chamado Market Board, onde jogadores podem comprar e vender seus itens uns para os outros.

Uma informação extra que torna Final Fantasy XIV único é o fato de que cada personagem pode possuir todas as classes do jogo, como se o protagonista decidisse aprender uma nova arte. Isso torna desnecessário (embora alguns ainda o façam por outros motivos) ter mais de um personagem na mesma conta. É possível trocar de classe com um simples apertar de botão. Contudo, cada classe tem sua própria barra de experiência e suas quests específicas, então ainda é necessário desenvolver cada uma separadamente.

O impacto que Final Fantasy XIV teve na minha vida

Dado todo este contexto, gostaria de compartilhar um pouco sobre minha experiência pessoal com o jogo. Não é exagero dizer que as mais de 2600 horas de Final Fantasy XIV mudaram muitas coisas em mim, algumas das quais eu jamais imaginaria quando peguei meu primeiro cajado em Gridania, lá em 2020.

Cheguei ao game porque, alguns anos antes, alguns amigos e eu resolvemos reviver a experiência de jogar Ragnarok Online. Apesar de termos nos divertido bastante por um tempo, os problemas de um jogo datado, além das rotinas diferentes de cada um de nós, acabaram nos afastando do game e separando parte do grupo.

Assim, em 2020, um outro amigo me convidou para jogar FFXIV, mencionando o período gratuito que era bem extenso. Aqui cabe uma informação muito importante: eu sofro de uma ansiedade social bem intensa, e esse amigo já tinha um grupo razoavelmente grande de amigos que jogavam com ele.

Como pode imaginar, o convite não parecia tentador por conta desses fatores. Minha experiência com Ragnarok raramente envolvia desconhecidos, já que, na maior parte do tempo, éramos apenas meus amigos e eu em um canto do mapa, matando monstros e batendo papo por chat de voz. Começar um novo jogo onde eu conhecia apenas uma pessoa e essa pessoa já tinha seus próprios amigos, me deixava acuado.

Encarando meus medos, certo dia aceitei o convite e entrei no jogo. Comecei sozinho, ocasionalmente pedindo dicas ao amigo que me convidou. Pouco mais de uma semana depois, fui apresentado a alguns dos amigos dele em Costa Del Sol, uma região de Eorzea com praias deslumbrantes.

Esse dia foi um divisor de águas para mim, me dando o primeiro vislumbre do que era Final Fantasy XIV e por que, hoje, ao escrever este artigo, o jogo se tornou tão importante na minha vida. Passamos cerca de uma hora apenas conversando e brincando na água e areia da praia. Tiramos fotos com o GPose (um modo foto embutido no jogo), recebi presentes (incluindo uma quantidade exorbitante de… ovos cozidos) e, apesar de estar nervoso a maior parte do tempo, foi a primeira vez que senti que estava em outro mundo, uma sensação que todo MMORPG almeja proporcionar aos seus jogadores.

Sou amigo de diversas pessoas desse grupo até hoje e conheci alguns deles pessoalmente, trazendo a amizade para além do game. Durante esses quatro anos, casais foram formados e desfeitos, brigas aconteceram e foram resolvidas, novas pessoas entraram no grupo e muitos memes internos nasceram. Isso pode parecer comum para alguns leitores, mas é algo incrivelmente valioso para alguém como eu.

Pessoas com condições como a minha não costumam ter amizades duradouras, muito menos algo luxuoso como um grupo de amigos. Final Fantasy XIV me proporcionou isso, com o bônus maravilhoso de expandir amizades online para a vida real. Assim, quando termino minhas obrigações do dia e entro em Eorzea, é algo muito diferente de apenas entrar em um joguinho para matar monstros com meus amigos.

Então, registrado meu relato sobre o quanto Final Fantasy XIV significa para mim depois de quatro anos, pouco mais de 2600 horas jogadas (e muito mais por vir), tenho um convite para qualquer um de vocês que talvez se sinta sozinho e com saudade de um bom jogo que te traga novos amigos, como nos bons tempos.

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Principimi

Estudante de Letras - Japonês na Cruzeiro do Sul; formado em paleografia na oficina Sérgio Buarque de Holanda e em design pela Saga. Prefere jogos narrativos, RPGs ou de ritmo. Atualmente passa horas jogando indies e RPGs no Switch ou sustentando seu vício em gachas de celular. Tem como franquias favoritas Fire Emblem, Pokémon, Persona e Final Fantasy. Enciclopédia humana de Love Live e garota mágica nas horas vagas.