O gênero hack-and-slash é um dos muitos estilos de jogos que surgiram no final dos anos 80 ao lado das primeiras categorias de videogames. Contudo, sua popularidade explodiu junto à chegada dos processadores de 128 bits, com o poderio dos gráficos 3D nos consoles da época possibilitando novas ideias de jogabilidade envolvendo, no geral, “destruir e cortar” inimigos.
Neste artigo, vamos falar de quatro franquias japonesas responsáveis por estabelecer as fundações do gênero nos anos 2000: Devil May Cry, Ninja Gaiden, No More Heroes e Bayonetta. Pode-se dizer que os títulos originais dessas séries definiram muitos dos aspectos que jogadores vieram a esperar de obras hack-and-slash, então vale a pena voltar no tempo para dar uma olhada nesses clássicos.
Mas afinal, o que é, exatamente, hack-and-slash?
Tal como run-and-gun (“correr e atirar”) e outros termos um tanto autoexplicativos, hack-and-slash trata-se basicamente de um subgênero de jogos de ação. No geral, títulos do tipo colocam o jogador no papel de um personagem que deve avançar pelo cenário destruindo (“hack”) e cortando (“slash”) inimigos em seu caminho com armas de fogo e lâminas.
Evidentemente, as origens desse estilo de jogo podem ser observadas no gênero beat-’em-up, com obras clássicas como Final Fight e Streets of Rage. Entretanto, o diferencial principal está na ênfase em armas e, em títulos da atualidade, interações com o cenário através de quebra-cabeças, elementos de games de plataforma e outros tipos de desafios.
Como em qualquer outro gênero ao decorrer de tantas décadas, várias mecânicas foram sendo introduzidas e replicadas em diferentes jogos. Assim, mesmo com diversos títulos se encaixando no gênero de hack-and-slash, alguns adotam elementos que essencialmente os colocam numa subcategoria específica, como é o caso da franquia Warriors e seus semelhantes.
Devil May Cry: A Ascensão do “Character Action”
Com o lançamento de Devil May Cry em 2001, o PlayStation 2 se tornou o console pioneiro dos hack-and-slash. Nas mãos de Hideki Kamiya, o título introduziu uma espécie de fórmula para jogos de ação que viria a ser conhecida como “character action”, ou “ação de personagem”, algo que seria visto novamente em vários games japoneses e ocidentais na plataforma.
Fãs da Capcom já estão cansados desta história: o que era para ser o Resident Evil 4 original acabou gerando uma nova série focada num carismático caçador de demônios. Se desviando totalmente de suas origens, Devil May Cry trouxe uma jogabilidade altamente focada em combate, com jogadores podendo se exibir com combos estilosos, incentivados por um memorável sistema de ranking.
Protagonizando a ação de alta octanagem estava Dante, o herói que rapidamente se tornou um dos personagens de videogame mais populares de todos os tempos. O humor e comentários sarcásticos do caçador de demônios contribuíram para que ele passasse a viver de graça na mente de jogadores por muitos anos e influenciasse a personalidade de protagonistas em títulos que vieram mais tarde.
Já contando com várias sequências através das gerações de consoles, Devil May Cry ainda é vista por muitos como uma franquia pilar dos jogos de ação, especialmente hack-and-slash. Nascendo na plataforma da Sony, parecia simplesmente inevitável que as aventuras de Dante ganhassem um tipo de rival noutra plataforma que já estava competindo por espaço…
Ninja Gaiden: Valorizando a Dificuldade Elevada
Conhecido como um divisor de águas no que diz respeito aos seus jogos, Tomonobu Itagaki é uma figura controversa no mundo dos games. Criador da série de jogos de luta Dead or Alive, o designer deixou a Tecmo em 2008, mas não antes de reviver uma franquia clássica nos moldes do hack-and-slash moderno.
Com sua própria equipe dentro da desenvolvedora, a Team Ninja, Itagaki renasceu Ninja Gaiden no Xbox em 2004. De forma semelhante aos primórdios da série nos anos 80 e 90, o título acompanha as aventuras do ninja Ryu Hayabusa na missão de recuperar uma espada lendária, enfrentando vários obstáculos pelo caminho.
Enquanto o Devil May Cry de apenas alguns anos antes buscava enfatizar combos estilosos, o título da Tecmo incentivava jogadores a serem mais metódicos com seus ataques. O objetivo então se tornava dominar as técnicas do herói para contra-atacar ondas de vários tipos de inimigos agressivos e evitar seus golpes perigosos.
Dessa forma, Ninja Gaiden se provou um título bem desafiador em comparação à sua contraparte no PS2, o que casou bem com a tradição que a série já tinha estabelecido no NES em 1988. Adicionando ainda mais ao desafio, níveis de dificuldade superiores ofereciam variações extras de inimigos ainda mais habilidosos, proporcionando algo a mais para jogadores corajosos o bastante.
Itagaki e sua equipe realmente buscaram abraçar esse aspecto da jogabilidade difícil, algo que muitos jogadores apreciam no gênero de hack-and-slash. Com um estilo de jogo focado em combate rápido e agilidade, constantemente se desafiar mais e mais se torna uma diversão quase infindável, e algo muito bem proporcionado e recompensado por Ninja Gaiden e sua versão aprimorada, Black, que incluía ainda dois modos de dificuldade adicionais.
Jogos difíceis, é claro, existem desde os primórdios dos videogames, e até hoje podemos ver o seu apelo através dos ascendentes gêneros Souls-like e Roguelike. A própria Team Ninja continua a investir nisso através de títulos como Nioh, que, de uma forma ou outra, inevitavelmente, carrega o DNA de Ninja Gaiden e essa característica importante de hack-and-slash.
No More Heroes: Um Caminho Alternativo
Depois de Devil May Cry no PlayStation 2 e Ninja Gaiden no Xbox fazerem história no gênero hack-and-slash, chegou a vez da Nintendo ter o seu próprio “slasher”. Foi com o Wii, um console que já trazia uma proposta bem diferente para o mercado, que a “Big N” pôde colocar o seu nome nesse gênero, graças ao novo título estranho de Goichi Suda.
Após a recepção morna de Killer7 em 2005, o designer se dedicou à produção de um novo game que tomaria proveito dos inovadores controles de movimento da plataforma da Nintendo. Desta vez, o objetivo seria criar um título no popular gênero de hack-and-slash, porém com o estilo característico das obras de Suda. Assim, em 2007 nascia No More Heroes, para enorme sucesso de público e crítica.
Seguindo o estereotipado otaku Travis Touchdown, o game decidiu seguir uma direção alternativa à de seus antecessores, trazendo sérios ajustes à fórmula. Equipado apenas com sua espada brilhante, o herói engaja em combates simples e recheados de movimentos de luta livre, sem grandes variações de ataques, diferente do que era visto com os combos de Devil May Cry e outros.
Além disso, um foco especial foi dado ao cenário. Apesar de títulos anteriores do gênero focarem em level design e interações com objetos ao redor, poucos realmente davam muita atenção à exploração. Isso mudou com No More Heroes, que introduziu jogadores a um mundo aberto que servia como o palco para várias missões, um elemento emprestado dos jogos Grand Theft Auto.
Em adição a um cenário vasto, o título também se destacou por trocar os tradicionais segmentos de quebra-cabeças por diversos minigames criativos. Tipicamente, essa tradição serve justamente para proporcionar a jogadores uma pausa dos combates, momentos de descanso de certa forma, e a aventura de Travis sem dúvidas garantiu uma certa personalidade ao mudar essa fórmula.
Não seria incorreto dizer que No More Heroes abriu as portas para pegadas bem diferentes do gênero hack-and-slash, sem sentir a necessidade de manter a seriedade dos títulos mais populares. Esse clima alternativo pode ser notado logo de imediato, graças ao estilo cel shading dos gráficos, que evocam visuais de anime e tornam o jogo bem atraente para uma audiência que talvez tenha facilidade em se identificar com o herói otaku da história.
Bayonetta: A Evolução do “Character Action”
Apesar de ter criado um dos títulos mais importantes do gênero, Hideki Kamiya nunca pôde dirigir as sequências de Devil May Cry. Hoje, fãs já estão acostumados com o fato do designer não desenvolver as continuações de seus jogos, mas mesmo assim ele já fez a coisa mais próxima disso para a sua obra de maior sucesso: um sucessor espiritual.
Fundada por ex-funcionários da Capcom, incluindo Kamiya, a recém fundada PlatinumGames estava precisando de um título que a colocaria no mapa. Assim, ao lado de sua equipe apelidada de “Team Little Angels”, uma referência aos “Little Devils” que criaram DMC, o diretor partiu para produzir um novo hack-and-slash, usando tudo o que ele aprendeu anos após seu trabalho com Dante.
Após dois anos de desenvolvimento, o resultado foi Bayonetta, um jogo sensual e elegante lançado em 2009 para PS3 e Xbox 360. Como não poderia deixar de ser, o título evolui muitas das ideias introduzidas em Devil May Cry e as casa com mecânicas que surgiram ao decorrer dos anos.
No lugar de Dante entra a titular Bayonetta, uma bruxa de carisma semelhante ao do caçador de demônios que também recheia suas aventuras com comentários sarcásticos. Kamiya parece se divertir ainda mais escrevendo a heroína, a colocando em diversas situações absurdas e dando ênfase ao seu lado sensual em várias cenas.
Com uma jogabilidade memorável e replicada em outros títulos icônicos do estúdio, Bayonetta traz de volta o sistema de ranking de DMC, além de ainda mais opções de combos, em parte graças a um arsenal variado que pode ser customizado e combinado. Em adição, o jogo busca desenvolver ainda mais a agilidade dos jogadores, os recompensando por esquivas bem executadas com vantagens temporárias sobre inimigos.
Permitindo que jogadores façam tanta coisa durante o combate, o título é excelente para aqueles que desfrutam da liberdade de experimentar com diferentes ataques e estratégias. É seguro dizer que a PlatinumGames teve sucesso em se catapultar na consciência do público com esse jogo, mais tarde trazendo de volta experiências semelhantes por meio de uma sequência e outras obras.
Pensamentos finais
Evidentemente, o hack-and-slash passou por muitas mudanças desde o lançamento de Devil May Cry em 2001. Vários títulos contribuíram para essa evolução, com os quatro que citamos sendo alguns dos principais que contribuíram para definir muitas das características esperadas de um bom jogo de ação do tipo.
DMC estabeleceu uma fórmula de sucesso, servindo de base para muitos games do gênero. Enquanto isso, Ninja Gaiden enfatizou a importância da jogabilidade desafiadora, incentivando jogadores a sempre se superarem e dominarem suas técnicas.
No More Heroes, por sua vez, abriu as portas para caminhos alternativos na categoria, mostrando que nem todos precisam necessariamente seguir a mesma filosofia para obter sucesso. Finalmente, Bayonetta serviu como a culminação de quase uma década de auge dos hack-and-slash, trazendo várias ideias interessantes para títulos futuros.
Qual dos jogos da lista você mais jogou? Tem alguma outra obra do gênero que te marcou? Vamos discutir nos comentários abaixo!