Yakuza 0 – O início de uma lenda! | #DensetsuIndica


O mundo dos jogos eletrônicos é um universo sem tamanho. Empresas populares e desenvolvedores independentes trazem suas diversas criações a esse infindável universo com títulos e franquias novas sendo lançadas constantemente em uma velocidade tão grande — bem típico da indústria de entretenimento — que certos jogos acabam sendo engolidos pela quantidade sempre crescente de novidades e acabam pouco vistos e esquecidos pela maior parte do público.

Dito isto, esses jogos constantemente ganham seguidores e um público mais reservado, mais de “nicho”. Com o passar do tempo, sempre existem chances de uma empresa reviver franquias anteriores com novos jogos, revivendo o amor dos fãs antigos e conseguindo novos fãs, e foi exatamente isso que aconteceu com a série Yakuza através do novo título que explicaria as origens de toda a saga: Yakuza 0.

Logotipo de Yakuza 0

Yakuza 0 (ou Ryuu Ga Gotoku Zero — algo tipo “Como um Dragão Zero”), lançado pela Sega no ano de 2015, foi um dos resultados de um projeto de aniversário da franquia (que teve seu início em 2005 no PlayStation 2), como um modo de trazê-la para a nova geração de consoles e tornar seu nome melhor conhecido novamente através de um jogo que mostrasse as origens da história da saga e usasse dois dos personagens mais queridos dos conhecedores dos jogos para agradar a todos os públicos.

O jogo nos leva ao final dos anos 80, nas cidades de Kamurocho e Sotenbori (recriações de Kabukichou, em Tóquio, e Dotonbori, em Osaka, respectivamente), começando com um jovem rapaz chamado Kazuma Kiryu em seus plenos 20 anos de idade e integrante da família Dojima, uma das vertentes da infame máfia japonesa, a Yakuza.

Após aceitar o trabalho de coleta de dinheiro para um agiota em um lote aparentemente abandonado da cidade e dar uma surra feia no homem que devia dinheiro, Kiryu se reúne com seu irmão adotivo, Nishikiyama, discutindo um pouco a relação dos dois e refletindo sobre seu pai adotivo, Shintaro Kazama, Capitão da família Dojima que está atrás das grades depois de um acidente. Após um pouco de conversa e exposição, os dois jovens resolvem parar para relaxar um pouco na vida noturna de Kamurocho e a cidade lhes dá o melhor!

Infelizmente para eles, no dia seguinte, o noticiário na televisão mostra que o mesmo homem que Kiryu havia “amaciado” no dia anterior foi encontrado morto no mesmo lote abandonado e naturalmente nosso protagonista é o suspeito número 1, mesmo não tendo realmente cometido o assassinato. Chamado ao quartel-general dos Dojima, Kiryu é confrontado pelos tenentes da Família e resolve deixá-los para evitar conflitos e possíveis repercussões negativas ao seu pai. Mas Kiryu estava andando de acordo com os planos de seus antigos chefes: Quem for dono daquele lote aparentemente abandonado terá a cidade de Kamurocho em suas mãos e será o novo Capitão da Família Dojima, tomando o lugar de Shintaro Kazama.

Enrolado em maus lençóis e com os mais perigosos tenentes da Yakuza em seu encalço, Kiryu resolve impedir que isso aconteça pelo lado de fora, como um civil, contando com a ajuda de um homem associado de seu pai: Tetsu Tachibana.

Screenshot de Yakuza 0

Enquanto isso, em Sotenbori, vemos a história de um homem de tapa-olho chamado Goro Majima, consagrado como O Senhor da Noite, dono de um dos maiores cabarés da cidade e excepcional na execução de seu trabalho! Como um homem desse porte poderia estar tendo problemas? A resposta é simples: Yakuza. Majima era da Família Shimano e foi exilado de seu posto na Família e no Clã por um trabalho misterioso que deu errado. Agora, forçado a viver enjaulado em Sotenbori, Majima é responsável por uma dívida monstruosa para o Clã e está em constante observação por seu superior, Sagawa, e não importa a quantidade de dinheiro que Majima junta, nunca parece ser o suficiente.

Sagawa faz uma perigosa e tentadora proposta: Majima poderá viver como um homem livre novamente e voltar à Família Shimano se, e somente se, conseguir tirar a vida de uma pessoa chamada Makoto Makimura. Mesmo se dizendo disposto a fazer qualquer trabalho, Majima se vê conflitado em ter que tirar a vida de uma pessoa e quanto mais ele se aprofunda na ideia, mais complicadas as coisas ficam…

Screenshot de Yakuza 0

A história é um foco principal de Yakuza 0, sendo contada entre muitas cinemáticas bem animadas e diálogos usando a própria “engine” do jogo — cheia de reviravoltas, confrontos brutais e momentos com atmosfera especialmente tensa e pesada. Espaçada entre 17 capítulos, a história de Yakuza 0 troca constantemente o foco entre Kiryu e Majima de uma maneira cautelosamente planejada de modo que sempre que vem uma grande revelação na história de um dos personagens, o jogo deixa o jogador em um gancho e muda o foco para o outro personagem, fazendo com que você sempre queira seguir em frente e ver o que vai acontecer no próximo capítulo. Os momentos tão bem construídos certamente carregarão a atenção de quem estiver jogando até o final.

Nos momentos entre partes principais da história, o jogo permite que você ande livremente pelas cidades de Kamurocho e Sotenbori (com Kiryu ou Majima, respectivamente). Aqui se destaca o segundo ponto mais chave de Yakuza 0: A vida em um dos distritos de prazer do Japão. A cidade está recheada de lojas, bares, restaurantes e diferentes estabelecimentos de lazer que o jogador possui livre acesso, como alas de boliche, bares de karaokê, dardos ou sinuca, galerias de fliperamas, cassinos, discotecas, telekuras (clubes de “encontros” marcados por telefone)… a lista de opções é bem variada!

Andando pela cidade e acessando os diversos lugares disponíveis, vários personagens que precisam de ajuda aparecerão e darão início às incontáveis “sub-histórias” do jogo. Nessas atividades, o jogo dá uma completa virada de tom para algo bem mais leve e patetamente exagerado, muitas vezes pegando os jogadores desprevenidos e com certeza garantindo risadas no processo. Yakuza 0 é um jogo em que em um momento você está sozinho em uma sala com um dos tenentes mais perigosos da máfia japonesa apontando uma arma em sua direção, no meio do domínio dele, e no outro, você está fazendo isso:

Yakuza 0 se banha em um grande e bombástico espetáculo de exagero, seja nos momentos sérios ou engraçados, e essa é uma das características mais aparentes da franquia, o que é 100% averiguado pelo outro ponto mais importante do jogo: o combate.

O sistema de combate é algo similar a um “beat-em-up” em 3D, com um sistema de mira individual para lidar com um oponente só ou ataques soltos para lidar com grupos de capangas, combos usando ataques leves e fortes, agarrões, esquiva e um botão para defesa. Os protagonistas do jogo são grandes lutadores em treinamento, e cada um possui três estilos de luta diferentes que são desbloqueados com o decorrer da história — um balanceado, um focado em velocidade e um focado em força bruta. Os três possuem vantagens e desvantagens próprias, são recomendáveis em diferentes situações e podem ser treinados com mestres diferentes e melhorados com dinheiro literalmente investido em si mesmo.

Os novos movimentos incluem melhor movimentação, mais golpes, maior barra de vida e diferentes “heat actions”. As heat actions são movimentos especiais que dão uma séria quantidade de dano em oponentes, mas só podem ser usados com uma certa quantia da barra de “Heat”, uma barra separada em 3 partes logo abaixo da barra de vida do personagem que simboliza sua adrenalina e seu envolvimento no combate. Certas ações só podem ser realizadas enquanto se está calmo (primeira “heat bar”), outras só podem ser realizadas quando se está com adrenalina máxima (terceira “heat bar”), e são o uso dessas barras de adrenalina que fazem com que Yakuza 0 e o combate da franquia se tornem únicos.

Screenshot de gameplay de Yakuza 0

Infelizmente, também é nesse sistema que os problemas de Yakuza 0 começam a aparecer. O combate em Yakuza 0 é cheio de espetáculo e movimentos diferentes que você pode fazer, mas não possui um nível de profundidade que realmente faça com que ele se torne satisfatório de dominar. Os ataques dos oponentes são pouco telegrafáveis, ou seja, são pouco predizíveis, com indícios muito breves e rápidos de seus ataques, o que faz com que muitas vezes o jogador acabe levando golpes “de graça” em combate. As habilidades de esquiva também deixam bastante a desejar, com algumas delas só valendo a pena ser usadas depois de várias melhorias para liberar a vantagem “esquiva melhorada” (o que deveria ser, em minha opinião, o natural desde o início).

Mesmo com os três estilos de luta diferentes, o combate de Yakuza 0 pode acabar se tornando repetitivo, já que a estratégia para lidar com os oponentes é quase sempre a mesma e os oponentes não variam muito além de posturas diferentes para fazer golpes muito similares ou casualmente brandir facas ou armas de fogo. Isso vale até mesmo para os chefes do jogo: A ideia de Yakuza 0 de um “chefe” é um oponente normal que defende mais vezes, tem golpes que quebram sua defesa e tem uma barra de vida cinco vezes maior. Pouquíssimas vezes eles possuem golpes únicos ou marcantes que realmente façam as lutas parecerem diferentes de um combate qualquer e a estratégia nunca sai do nível básico para qualquer oponente enfrentado no jogo, o que com certeza desapontará aqueles esperando um combate mais estratégico ou bem pensado.

Imagine se em Devil May Cry 3 todos os chefes — incluindo o Cérbero do início do jogo — tivessem os mesmos movimentos de um inimigo normal, ou se em The Legend of Zelda: Breath of the Wild ou Ocarina of Time todos os chefes pudessem ser derrotados apenas por apertar o botão de ataque repetidamente. Você levaria dano, sim, mas eventualmente você derrotaria o chefe sem esforço. É essa sensação que o combate de Yakuza 0 passa.

Gif demonstrando Quick-Time Events de Yakuza 0

Além disso, como o gif acima demonstra, o jogo está repleto de QTEs (“quick-time events”), as famosas situações “aperte esse botão na hora certa no meio dessa cinemática ou você perde vida”, bem famosa por jogos como God of War, Resident Evil 6 ou Asura’s Wrath. As situações onde QTEs aparecem raramente são situações de vida ou morte, mas ainda assim a presença frequente destas em horas tão repentinas é incômoda e deve ser notada.

Outro ponto que deve ser chamado a atenção são duas “sidestories” principais. Cada um dos personagens possui uma “sidestory” de maior escopo: Presidiar uma Imobiliária, no caso de Kiryu, e ser dono de um “Cabaret Club” (clube de ‘hosts’ e ‘hostesses’ comum no Japão) no caso de Majima. Cuidar do Cabaret Club de Majima é algo que tem um minigame dedicado onde o jogador tem que comandar em tempo real o clube, vendo a clientela que chega e colocando diferentes moças de acordo com os gostos dos clientes para poder ganhar dinheiro, satisfazer os clientes e competir com os outros Cabaret Clubs de Sotenbori. É um minigame divertido e que os desenvolvedores passaram tempo pensando cuidadosamente.

Já no caso da Imobiliária de Kiryu, tudo o que o jogador precisa fazer é investir em algumas propriedades, decidir quem são os gerentes de diferentes áreas e depois esperar até que a coleta do dinheiro dos investimentos esteja completa para comprar uma nova propriedade e repetir o ciclo até tomar a cidade toda de volta dos bilionários inimigos. De vez em quando, problemas irão surgir e você terá de ir até um lugar específico da cidade e bater nos causadores dos problemas, mas isso é literalmente o que você já terá feito durante o jogo inteiro em outras situações e “sidestories”, fazendo com que a “sidestory” da Imobiliária seja longa, demorada e, acima de tudo, entediante.

Screenshot de Yakuza 0
Trabalhando com Majima, você pode até pegar novas dicas de sinais que as pessoas fazem nos bares!

A este ponto, acho que consigo resumir os problemas e discussões de Yakuza 0 em uma palavra: Foco. O grande “quê” do jogo é a disparidade de foco. Um foco muito grande em alguns pontos e muito pequeno em outros. Por exemplo, existe um foco muito grande no espetáculo e no estilo das “heat actions” apresentadas no jogo, tendo diferentes animações e oportunidades para novos golpes brutais para finalizar seus oponentes, o que torna o combate muito estiloso e bonito de se ver, mas o combate em si é ralo e sem estratégia. O jogo possui um minigame de karaokê que é basicamente um jogo de ritmo que funciona muito bem e é um dos momentos onde o tom pateta e engraçado do jogo brilha em cores maravilhosas, mas as músicas são apenas 6 e apenas metade destas são cantadas pelos protagonistas e enquanto isso, as salas de Terekura também possuem um minigame próprio mas que contém várias “sidestories” diferentes atreladas a ele com diferentes resultados para cada uma. E finalmente, o sistema de batalha de Majima é bem mais refinado do que o de Kiryu desde o início: seus golpes são mais rápidos, sua esquiva é mais ágil e os estilos de luta são mais diferenciados e versáteis. Consegue entender o que eu digo com “disparidade de foco”?

Porém, mesmo com todos os problemas, Yakuza 0 me manteve entretido por sua história executada de maneira excelente, pelos minigames cativantes (mesmo com sua falta de foco), suas “sidestories” interessantes e muitas vezes ridículas e pelas diferentes “heat actions” que, apesar de tudo, são muito satisfatórias de ver. Ora, o jogo possui fliperamas dedicados da Sega com direito a máquinas que permitem jogar clássicos de arcade da empresa como Space Harrier, OutRun e até desbloquear Fantasy Zone e Super Hang-On!.Uma das “sidestories” coloca Kiryu como um diretor de cinema, onde ele depois conhece Steven Spielb… quer dizer, Stephen Spining, que vai gravar o novo videoclipe de Michael Ja… quer dizer, Miracle Johnson, que tem que fugir de zumbis enquanto atravessa uma das ruas de Kamurocho!

Miracle Johnson de Yakuza 0

E VOCÊ GANHA UMA GALINHA CHAMADA NUGGET QUE VIRA SEU GERENTE NA IMOBILIÁRIA! EU REPITO, VIRA SEU GERENTE NA IMOBILIÁRIA!!!!!

Nugget e Kiryu em Yakuza 0

Concluindo, Yakuza 0 é uma ótima introdução à saga de Kiryu e Majima, contando com diversas situações de espetáculo bombástico, tensão, risadas e muita coisa para se amar. Apenas se prepare para enfrentar alguns problemas com o combate raso e os problemas de foco que o jogo apresenta.

Se você conseguir terminar as “sidestories” principais de cada personagem, você consegue desbloquear um quarto estilo de luta para cada um, que realmente deu os títulos conhecidos a cada um deles, o “Dragão dos Dojima” e o “Cachorro Louco dos Shimano”. Ao fim da jornada, você está livre para explorar o mundo de Kamurocho e Sotenbori o quanto desejar.

Mesmo com todos os problemas que o jogo apresenta, ainda é uma experiência válida e que com certeza lhe trará diferentes emoções e muitas risadas.

Yakuza 0 está disponível para PS3, PS4 e recentemente ganhou uma versão para PC (via Steam). Se você está interessado em um jogo que dê uma boa história, boas risadas e uma boa dose de espetáculo, Yakuza 0 é altamente recomendado.

Artigo escrito por: Ítalo Magno

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